Há muitas variantes ou versões do personagem. Em algumas, o Saci é considerado um ser brincalhão, enquanto que em outras ele é visto como uma criatura do mal. Sua figura, no entanto, é sempre semelhante: um menino negro, de uma perna só, que fuma cachimbo e usa um gorro vermelho.
Para alguns, é justamente este gorro que lhe dá poderes mágicos. Entre outros, o poder de desaparecer e aparecer quando quiser. O Saci gosta de travessuras e se diverte espantando cavalos, ou trançando-lhes a crina, queimando a comida e acordando as pessoas com gargalhadas.
Também gosta de esconder brinquedos e derramar sal nas cozinhas. Ele não atravessa córregos nem riachos. Se alguém for perseguido por um saci, deve jogar cordas com nós em seu caminho, pois ele vai parar para desatar os nós.
Dizem que os sacis viajam no interior de redemoinhos de vento. Se alguém jogar no redemoinho um rosário ou uma peneira, pode capturá-lo. Se conseguir tomar sua carapuça, vai realizar um desejo.
Na origem do mito do Saci encontram-se alguns pássaros, capazes de enganar os homens com seu assobio, pois, como ventríloquos, essas aves seriam capazes de projetar sua voz, de modo que quem o escuta não sabe ao certo onde ele está. Entre outros pássaros, o Saci é identificado com o Sem-fim (Tapera naevia). Também pode ser o Mati-taperê ou Matita-Pereira ou ainda Matintapereira(Cuculus cornutus).
Este último faz parte de algumas crenças indígenas, segundo as quais os pajés ou feiticeiros se transformam nesse pássaro para se transportar de um lugar a outro e levar a cabo uma vingança.
No Estado de São Paulo e no município de Vitória, por leis locais, o 31 de outubro é o dia do Saci, que busca transformar num evento mais brasileiro o dia das bruxas ou halloween, do folclore norte-americano.
O Saci Pererê também se transformou em personagem nos livros de Monteiro Lobato e em histórias em quadrinhos, no traço bem humorado de Ziraldo, o conhecido autor de "O Menino Maluquinho".
O folclore é o conjunto das criações de uma comunidade cultural, baseadas nas tradições de um grupo ou de indivíduos, que expressam sua identidade cultural e social, além dos costumes e valores que se transmitem oralmente, passando de geração em geração.
A palavra folclore foi utilizada pela primeira vez num artigo do arqueólogo William John Thoms, publicado no jornal londrino "O Ateneu", em 22 de agosto de 1846 (por isso 22 de agosto é o dia do folclore). Ela é formada pelos termos de origem saxônica: "folk" que significa "povo" e "lore" que significa "saber". Portanto o "folklore" é o saber do povo ou a sabedoria popular. No Brasil, a palavra adaptada tornou-se "folclore".
Em todas as partes do mundo, cada povo tem seu folclore, sua forma de manifestar suas crenças e costumes. O folclore se manifesta na arte, no artesanato, na literatura popular, nas danças regionais, no teatro, na música, na comida, nas festas populares como o carnaval, nos brinquedos e brincadeiras, nos provérbios, na medicina popular, nas crendices e superstições, mitos e lendas.
Mitos e lendas
As lendas misturam fatos reais e históricos com a fantasia e procuraram dar explicação aos fatos da vida social de uma determinada comunidade. Os mitos, tão antigos quanto a própria humanidade, são narrativas que possuem um forte simbolismo e foram criados pelos povos primitivos para explicar as coisas que não entendiam, como os fenômenos da natureza.
No Brasil, o folclore foi resultado da miscigenação de três povos (indígena, português e africano) e da influência dos imigrantes de várias partes do mundo. Por isso, nosso país tem uma tradição folclórica variada, rica e muito peculiar. Em cada região brasileira, o folclore apresenta semelhanças e diferenças.
Curupira
O guardião das florestas
Da Página 3 Pedagogia & Comunicação
Na maioria das versões do mito, o Curupira é um menino pequeno ou um anão, de cabeleira vermelha, que tem os pés invertidos com os calcanhares voltados para trás. Essa imagem está de acordo com o significado de seu nome, que é formado de "curu", uma contração de "curumim", que significa "menino" e "pira" que quer dizer corpo. Daí "curupira" dar a entender algo como "corpo de menino", ou criatura com corpo de menino.
Em outras variantes do mito, porém, o curupira chega a ser um gigante. Suas características, por sinal, vão se modificando de acordo com os deslocamentos geográficos, conforme ensina o folclorista Luís da Câmara Cascudo. Em algumas regiões do Pará, ele tem quatro palmos de altura. No rio Negro, é calvo e tem o corpo peludo; no Solimões tem dentes azuis e orelhas grandes.
Não importam as variações, ele sempre tem os pés ao contrário, o que talvez se justifique por sua função de protetor das árvores, dos animais e da mata. Deixando rastros inversos, o curupira desorienta os caçadores e os faz se perder na floresta. Para confundi-los ainda mais, ele usa assobios que parecem vir de um lugar, quando, na verdade, vêm de outro.
O curupira também costumava ser a explicação de rumores misteriosos na floresta, desaparecimento de caçadores, perda de rumo ou esquecimento do caminho. Segundo algumas lendas, o curupira faz acordo com os caçadores, providenciando armas infalíveis para a caça, em troca de alimentos, de fumo ou de cachaça.
A oferenda de presentes no mato, para fazer o curupira acalmar-se e não atacar os seres humanos, é uma prática registrada entre os índios e mesmo entre os seringueiros e roceiros do Amazonas. Contudo, mudam os presentes: os índios oferecem colares, pulseiras e enfeites plumários, ao passo que os caboclos oferecem comida, bebida ou fumo.
Um mito muito próximo do curupira é o do caapora. "Caapora" vem de "caa" que quer dizer mato e "porá" que significa habitante, morador. O caapora tem a mesma imagem do anterior e, como ele, também é um protetor da floresta. No entanto, ele não tem os pés virados e costuma se deslocar montado em um porco ou javali.
Tanto o mito do curupira quanto o do caapora se difundiram em todas as regiões do Brasil. E se trata de um mito antigo, cujo primeiro registro escrito é uma carta do padre José de Anchieta, de 30 de maio de 1560. Nela, o padre fala que os índios de Piratininga (São Paulo) contavam de demônios que habitavam as matas e que atacavam os indígenas, precisando ser acalmados com presentes.
Boitatá
Cobra de fogo ou alma penada
Da Página 3 Pedagogia & Comunicação
O nome "Boitatá" é composto pelos substantivos tupis "mboi", que significa "cobra" e "tatá", que quer dizer fogo. "Boitatá", portanto, equivale a "cobra de fogo". É um dos primeiros mitos indígenas a ser documentado pelo colonizador europeu, no caso o padre José de Anchieta, que em uma de suas cartas fala de um "fantasma", com a forma de "um facho cintilante" que ataca os indígenas e os mata.
Com certeza, o mito impressionou especialmente os europeus, dando origens a diversas lendas mestiças ou caboclas do nosso folclore, segundo as quais o Boitatá é o espírito de pessoas que não foram batizadas, ou ainda almas penadas, ou mesmo o filho da união de irmãos ou compadres. Também há variantes do mito que apresentam o Boitatá como uma entidade que defende os campos contra aqueles que os queimam para prepará-los para o plantio.
Já que se trata de uma serpente de fogo, os estudiosos crêem que o Boitatá pode ser explicado por um fenômeno natural: o fogo-fátuo, luz que aparece à noite, geralmente emanada de terrenos pantanosos ou de sepulturas, e que é atribuída à combustão de gases provenientes da decomposição de matérias orgânicas.
Semelhante ao Boitatá e, às vezes, confundido com ele, há o mito da Boiúna, característico da região amazônica, segundo o folclorista Luís da Câmara Cascudo. Novamente, trata-se de um nome composto: "mboi" = "cobra" e "una" = "preta". Daí que a Boiúna é, de fato, a sucuri ou a jibóia dos rios amazônicos. Entretanto, isso não impede que ela entre para o imaginário com características sobrenaturais.
A Boiúna é geralmente apresentada como uma serpente má, que ataca e devora os seres humanos. Segundo as lendas, à noite, seus olhos são como duas tochas que aparecem no rio para desorientar os navegantes. Quem a vê fica cego, quem a ouve fica surdo, quem a segue fica louco.
Além disso, a Boiúna pode adquirir diversas formas, desde uma simples nuvem de vapor até um grandioso navio. Desse modo, mais uma vez ela engana quem trafega pelas águas do rio e provoca sua ruína. Nesse sentido, a Boiúna pode ser identificada como uma entidade protetora das águas.
Criatura semelhante a Boiúna, eventualmente a mesma criatura, também aparece em nosso folclore com outras designações, como a de Cobra-Grande e Cobra-Maria.
Lobisomem
Homem atacado por lobo
Da Página 3 Pedagogia & Comunicação
Esse é um mito universal, presente no folclore de muitos países. Desde a Grécia antiga, ele é conhecido. Por isso, há sinônimos para lobisomem no grego ("licantropo") e no latim ("versiopelius"), bem como em línguas modernas: francês ("loup-garrou"), inglês ("werewolf" ou "wolfman") e espanhol ("lobisón"), por exemplo.
No Brasil, há diversas versões sobre o que leva um ser humano a se transformar em lobisomem. Alguns dizem que se trata de um homem que foi atacado por um lobo e não morreu. A contaminação pelas presas do animal faz com que a vítima passe a se transformar em lobo nas noites de lua cheia.
Outros acreditam que o lobisomem é o sétimo filho de uma mulher que, anteriormente, só teve filhas. Outros ainda dizem que o lobisomem é o filho ilegítimo que uma mulher e um padre geraram. Também há versões que falam de filhos de compadre e comadre ou de padrinho e afilhada.
Quando criança, o lobisomem é um menino magrinho, pálido, com as orelhas compridas. Ao completar 13 anos, as transformações começam a acontecer, nas noites de terça ou sexta-feira. Ele sai à noite e vai até uma encruzilhada, onde vira uma mistura de homem e lobo e uiva para a lua. Nessa noite, ele tem de visitar sete locais da região: sete igrejas, sete vilas e sete encruzilhadas. Por onde passa, assusta os cachorros e apaga as luzes das ruas e das casas.
Para se proteger do lobisomem a pessoa deve rezar três Ave-Marias. As lendas brasileiras não mencionam as balas de prata tão comuns nos filmes de terror norte-americanos. Para quebrar o encanto, é preciso bater forte na cabeça do monstro. Antes de o galo cantar, porém, o lobisomem volta ao lugar de onde partiu e se transforma outra vez em homem.
Segundo o folclorista Luís da Câmara Cascudo, o mito possivelmente teve origem em rituais religiosos da Antiguidade, em que sacerdotes vestiam peles de lobo, um animal que algumas tribos consideravam sagrado.
Transformações de homens em outros animais que não o lobo também são comuns no folclore de vários países e até de tribos indígenas brasileiras. Um caso interessante é o do capelobo, de índios da região norte do Brasil. Trata-se de um animal com corpo humano, coberto de pelos, e a cara de anta ou de tamanduá-bandeira.