A Lei Áurea acabou com a escravidão, mas não pensou na inserção dos negros na sociedade.
Antes de tudo, devemos pensar sobre o contexto em que a Lei Áurea fora assinada. Naquela época, os movimentos abolicionistas agitavam os grandes centros urbanos do país realizando vários alertas sobre a implicação negativa da escravidão no desenvolvimento do país. A exploração e os abusos dessa modalidade de trabalho eram sistematicamente criticados em seus aspectos morais e sociais. Além disso, a mesma era posta como um sinal da barbárie nacional em relação à “Europa civilizada”.
Vale também lembrar que, nos fins do século XIX, a escravidão era uma atividade econômica quase impossível. A proibição do tráfico negreiro internacional criou uma grave limitação da mão de obra, dificultou a obtenção de novas peças e encareceu o escravo no mercado. Apesar da ampliação do tráfico interprovincial, o uso dos escravos não conseguia suprir a enorme demanda gerada pela economia cafeeira. Não por acaso, vemos que a mão de obra dos imigrantes se transformava em uma opção mais atrativa.
Outro ponto a ser destacado também se relaciona com a própria intensificação dos negros nos episódios de rebelião dos escravos contra os seus senhores. Em 1835, a Revolta dos Malês serviu como um alarmante sinal de alerta sobre a capacidade que os escravos teriam na articulação de levantes contra a ordem vigente. Ao mesmo tempo, várias fugas e o surgimento de novos quilombos também contribuíram para a iminente crise do sistema escravista.
Com isso, ao abolir a escravidão, a princesa Isabel somente executava o “tiro de misericórdia” em uma relação de trabalho inviável. Entretanto, ao não dispor nenhum tipo de inserção dos negros à sociedade, a Lei Áurea se mostrou limitada ao manter os negros libertos na mesma condição de dependência e subordinação. Em várias situações, os salários irrisórios impunham uma condição de vida tão ou mais penosa para aqueles novos trabalhadores livres.
Na virada do século XIX, vemos que diversos ex-escravos se deslocaram para os grandes centros urbanos em busca de novas oportunidades de trabalho. No Rio de Janeiro, ocuparam desordenadamente antigos casarões e cortiços velhos que se transformaram em verdadeiros nichos de insalubridade e graves epidemias. Com o passar do tempo, vários negros libertos e seus descendentes vivenciaram o processo de exclusão que originou as primeiras favelas da capital.
Por Rainer Sousa
Mestre em História
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